A quem amo
por Maurício SantiniMeu amor, se eu te prender com as correntes do meu egoísmo, então não é amor, é escravidão e controle.
Se eu não sentir, ao menos, por ti, uma nesga de dor, então não é amor, é emoção efêmera.
Se não me bater a lembrança das horas que passamos espremendo os minutos, então não é amor, “é nuvem que passou e não choveu”.1
Se o teu riso, mesmo que distante, não desenhar o mesmo em minha boca, então não é amor, é desdém e contradição.
Se o teu pranto não contagiar meus olhos, então não será amor, posto que não há compaixão.
Se eu tapar os olhos dos teus defeitos e imperfeições, isso não é amor, é cegueira e paixão.
Por outro lado, se eu nunca agradecer pela tua existência em mim, não pode ser amor, é desleixo de quem só tem olhos pra si.
Se eu disser que te amo apenas no afã dos meus desejos, nos turbilhões da minha pele, então não é amor, é frase de momento, hálito de tesão.
E se eu tapar meus ouvidos aos gemidos da tua dor lancinante, quem pode dizer que isso é amor, é omissão e jogo.
Todavia, se eu saciar todos os teus anseios, até os mais injustos, então não se trata de amor, é compra, aquisição de um bem pelo poder.
Meu amor, se eu te abandonar na primeira rusga, no ato de uma bofetada do destino, então isso não pode ser amor, é medo das pedras do caminho.
Se eu, por ventura, servir-te apenas de escudo das tempestades de granizo, então continua não sendo amor, é só necessidade de proteção.
Se eu nunca verter nenhuma gota instantânea que sai dos meus olhos quando te vejo, então o amor não se faz em mim porque meu olhar está seco pelo vento.
Ao contrário, se eu não abrir meu sorriso e não te ofertar as pétalas que saem do meu peito quando penso em ti, então o meu amor não é um jardim fértil e feliz, jaz, com o tempo, em solo árido.
Assim, se eu me calar e esconder minhas palavras de afeição, talvez isso seja amor, um amor que busca o silêncio pra se expressar.
Ao mesmo tempo, se eu gritar que te amo e “meu coração não me sair pela boca”2 então não será amor, será tudo, menos amor.
E se eu estiver, de fato, contigo, mas minha alma voar distante, isso será amor porque estarei livre dos elos que te prendem ao meu ego.
Meu amor, se eu te amarrar em meus braços, estarei ocupado a aprisionar a mim mesmo, e isso não é amor.
Mas, se eu libertar-te de qualquer apego, tua distância fará com que te ame mais e mais...Infinitamente.
Assim, quando adormecer em mim o breu dos ciúmes e amanhecer em nós a manhã da liberdade, aí reside o amor, no espaço, solto entre os astros e as estrelas, deitado confortavelmente sobre as mãos de Deus!
1 – citação da canção A Montanha e a Chuva de Orlando Moraes
2 – citação de um verso de Rabindranath Tagore
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